quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

A Nudez do Homem no Jardim



Já ouvi em igrejas cristãs a afirmação, as vezes feita em tom de revelação, de que quando as escrituras relatam que Adão e Eva estavam nus (Gn. 2.25), na verdade, essa nudez era revestida de uma espécie de cobertura sobrenatural, algo como uma roupa espiritual que, quem defende essa ideia afirma se tratar da graça, cobria a nudez do primeiro casal.
Alguns chegam a descrever essa suposta cobertura dizendo tratar-se de uma espécie de redoma de fogo que impedia que Adão e Eva vissem sua nudez.  
Por se tratar de um tema complexo quero propor um estudo em três partes a serem publicadas em sequência nas postagens do Blog Preceitos de Fé.
Quero iniciar nosso estudo afirmando que acho temerosa essa interpretação deste relato das escrituras e me parece fruto do pudor humano quanto à nudez. 
A relevância da nudez
Se analisarmos atentamente o relato da criação do homem e da mulher, contido nos dois primeiros capítulos de Gênesis, percebemos que o fato de homem e mulher terem sido criados nus não parece relevante na narrativa.
Percebamos que tanto no relato da criação do homem do pó da terra (Gn. 2.7) como no da criação da mulher da costela do homem (Gn. 2. 21-22), o fato de ambos terem sido criados nus não é, sequer, mencionado.
A nudez do primeiro casal só é mencionada no último versículo do capítulo 2, mas aí com a clara intenção de fazer um contraposto aos versículos 7 e 10 do capítulo 3 de Gênesis.
Veja, o versículo 25 do capítulo 2 de Gênesis relata: “Ora, um e outro, o homem e sua mulher, estavam nus e não se envergonhavam. ” (Gn. 2.25). É nítida a intenção do escritor bíblico em afirmar que, embora Adão e Eva estivessem nus, isso não era motivo de vergonha para eles. 
O resultado do Pecado
Gn. 3.10
Tal afirmação de Gn. 2.25, contida no relato do momento anterior ao pecado, é evidentemente oposta à que encontramos no versículo 7 do capítulo 3 de Gênesis, onde o escritor bíblico relata o momento após a queda do homem no pecado: “Abriram-se, então, os olhos de ambos; e, percebendo que estavam nus, coseram folhas de figueira e fizeram cintas para si. ” (Gn. 3.7). 
...antes do pecado ambos estavam nus, mas não sentiam vergonha disso, foi o pecado que trouxe para o primeiro casal o “conhecimento” da vergonha de sua nudez
O relato de Gn. 2.25 também é contraposto à afirmação do próprio homem, que encontramos no versículo 10 do capítulo 3 de Gênesis, quando responde a Deus dizendo: “Ouvi a tua voz no jardim, e, porque estava nu, tive medo, e me escondi. ” (Gn. 3.10).
Em Gn. 2.25, antes do pecado, ambos estavam nus e não se envergonhavam, o verbo utilizado aqui, no original em hebraico é להתבושש (leyithboshâsh) que significa sentir vergonha. No versículo 7 do capítulo 3 de Gênesis, Adão e Eva souberam, perceberam que estavam nus, o verbo utilizado no original hebraico é לדעת (ladhath) que significa, saber, conhecer.
Fica evidente que antes do pecado ambos estavam nus, mas não sentiam vergonha disso, foi o pecado que trouxe para o primeiro casal o “conhecimento” da vergonha de sua nudez. 
Deus não traz vergonha
Se considerarmos que Deus criou o homem e a mulher nus e os cobriu com algum tipo de veste sobrenatural para encobrir deles a nudez, estamos imaginando que o Senhor deu ao homem algo (a nudez) que lhes era motivo de vergonha e apenas a encobriu para que não percebessem.
Ora, Deus não traz a vergonha (Sl. 25.3) porque nele não há mal algum (1Jo. 1.5) e imaginarmos que o Criador iria fazer algo vergonhoso ao homem no paraíso do jardim do Éden seria um contrassenso e a negação de Sua natureza. Quem traz a vergonha ao homem é Satanás e também é ele que aprecia encobrir a verdade.
Outro ponto que devemos atentar é no fato de que Deus ordenou, antes do pecado, que homem e mulher fossem fecundos, se multiplicassem e enchessem a terra (Gn.1.28), numa clara alusão a relação sexual que deveria haver entre ambos, mas como poderiam cumprir esse mandamento de Deus se estivessem revestidos por algum tipo de capa espiritual que os impedissem de ver os seus corpos nus?

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